terça-feira, 23 de novembro de 2010

Ampliação do espaço cultural na escola








Contribuição do prof. supervisor André Caetano:
Anton Makarenko - O professor do coletivo
O mestre ucraniano Anton Makarenko concebeu um modelo de escola baseado na vida em grupo, na autogestão, no trabalho e na disciplina que contribuiu para a recuperação de jovens infratores.
Imagine um educador que tem como missão dirigir um colégio interno (na zona rural) cheio de crianças e jovens infratores, muitos órfãos, que mal sabiam ler e escrever, numa época em que o modelo de escola e de sociedade estavam em xeque. Como educar? Por onde começar? Anton Semionovich Makarenko, professor na Ucrânia, país do leste europeu que era parte da União Soviética na época, foi um dos homens que ajudaram a responder a essas questões e a repensar o papel da escola e da família na recém-criada sociedade comunista, no início do século 20. Sua pedagogia tornou-se conhecida por transformar centenas de crianças e adolescentes marginalizados em cidadãos.
O método criado por ele era uma novidade porque organizava a escola como coletividade e levava em conta os sentimentos dos alunos na busca pela felicidade aliás, um conceito que só teria sentido se fosse para todos. O que importava eram os interesses da comunidade e a criança tinha privilégios impensáveis na época, como opinar e discutir suas necessidades no universo escolar. "Foi a primeira vez que a infância foi encarada com respeito e direitos", diz Cecília da Silveira Luedemann, educadora e autora do livro Anton Makarenko, Vida e Obra A Pedagogia na Revolução.
Mais que educar, com rigidez e disciplina, ele quis formar personalidades, criar pessoas conscientes de seu papel político, cultas, sadias e que se tornassem trabalhadores preocupados com o bem-estar do grupo, ou seja, solidários.
Na sociedade socialista de então, o trabalho era considerado essencial para a formação do homem, não apenas um valor econômico. Makarenko aprendeu tudo na prática, na base de acertos e erros, primeiro na escola da Colônia Gorki e, em seguida, na Comuna Dzerjinski. Cada etapa de suas experiências foi registrada em relatórios, textos e livros. As dificuldades e os desafios têm muitos paralelos com os dos professores de hoje. A saída encontrada há quase um século correspondia às necessidades da época, mas servem de reflexão para buscar soluções atuais e entender a educação no mundo.
Proteger a infância
A idéia do coletivo surge como respeito a cada aluno, oposta à visão de massificação que despersonaliza a criança. O grupo estimula o desenvolvimento individual. Como a instituição familiar (e tudo o mais na então União Soviética) estava em crise, essa foi a alternativa encontrada pelo educador para proteger a infância de seu país. O sentimento de grupo não era uma idéia abstrata. Tinha raízes nos ideais revolucionários e Makarenko soube como transformá-la em algo concreto. A colônia era auto-suficiente e a sobrevivência de cada um dependia do trabalho de todos. Caso contrário, não haveria comida nem condições de habitação aceitáveis.
Valorizar a disciplina
Para que a vida em comunidade desse certo, era essencial que cada aluno tivesse claras suas responsabilidades. "Nunca mais ladrões nem mendigos: somos os dirigentes." Makarenko era conhecido como um educador aberto, mas rígido e duro. Ele acreditava que o planejamento e o cumprimento das metas estabelecidas por todos só se concretizariam com uma direção muito firme. Por isso, os alunos tinham consciência de que a disciplina não era um fim, mas um meio para o sucesso da vida na escola. O descumprimento de uma norma podia ser punido severamente, desde que alunos e professores assim o desejassem, depois de muita discussão.
Envolver a família
Makarenko publicou em 1938, incompleto, o Livro dos Pais. O objetivo era mostrar a importância da participação da família na escola e como educar as crianças em tempos difíceis. Alguns estudantes moravam nas escolas dirigidas por ele. O educador ucraniano fazia questão da presença dos pais, que eram estimulados a participar de atividades culturais e recreativas. A escola tinha o papel de orientar a família, que deveria encará-la como um órgão normativo. Pais muito "melosos" ou ausentes seriam incapazes de educar uma pessoa forte, madura e inteligente. "O carinho, como o jogo e a comida, exige certa dosagem", dizia.
Makarenko queria formar crianças capazes de dirigir a própria vida no presente e a vida do país no futuro. Exercícios físicos, trabalhos manuais, recreação, excursões, aulas de música e idas ao teatro faziam parte da rotina. A escola tinha que permitir o contato com a sociedade e com a natureza, ou seja, ser um lugar para o jovem viver a realidade concreta e participar das decisões sociais. O estudo do meio já era comum na escola de Makarenko, ainda que sem esse nome. Na Colônia Gorki, meninos e meninas eram divididos em grupos de dez, de diferentes faixas etárias. Um representante de cada turma participava de assembléias e reuniões em que se discutiam as situações da escola: um objeto roubado, a melhoria do prédio, a compra de materiais, a limpeza dos banheiros, os problemas particulares. Sexo e namoro também tinham espaço nas reuniões. Normas e decisões não podiam ser predeterminadas. O primeiro e o último voto eram sempre dos alunos.
Um tempo de transformações
Anton Makarenko viveu as grandes transformações históricas do fim do século 19 e do começo do 20: o nascimento das grandes cidades e suas indústrias, as longas jornadas de trabalho, os movimentos revolucionários contra o império do czar Nicolau II, a Primeira Guerra Mundial e a revolução de outubro de 1917 que pôs fim à monarquia e instituiu a ditadura do proletariado na União Soviética. Em meio a tantas mudanças, o papel da criança, dos pais e da escola também estava em xeque. Que ser humano formar para viver nesse novo mundo? Makarenko conhecia, na prática, as necessidades da grande massa pobre da Ucrânia. Seus problemas não eram diferentes dos enfrentados hoje: a carência afetiva e material dos filhos dos operários; a audácia dos filhos dos burocratas, que não queriam fazer os trabalhos manuais e intelectuais, tão valorizados na sociedade socialista; e a ausência da família. Por isso, ele acreditava que a escola tinha que formar seres participativos por meio de uma organização coletiva e democrática, com muita disciplina e trabalho. E os pais que não conseguiam educar seus filhos deveriam ser reeducados por essa escola.
Biografia
Anton Semionovich Makarenko nasceu em 1888 na Ucrânia, filho de um operário ferroviário e de uma dona de casa. Aprendeu a ler e escrever com a mãe, como a maioria das crianças da época, e logo depois foi matriculado numa escola primária. Lá teve acesso às disciplinas de Língua Russa, Aritmética, Geografia, História, Ciências Naturais, Física, Desenho, Canto, Ginástica e Catecismo, mas não pôde estudar sua língua materna, a ucraniana, proibida pelo império czarista na Rússia, nem Lógica e Filosofia, exclusivas da elite. Aos 17 anos, Makarenko concluiu o curso de Magistério e entrou em contato com as idéias revolucionárias de Lênin e Máximo Gorki, que influenciaram sua visão de mundo e de educação. Sua primeira experiência em sala de aula ocorreu em 1906, na Escola Primária das Oficinas Ferroviárias, onde lecionou por oito anos. Em seguida assumiu a direção de uma escola secundária. Mais consciente do modelo de educação que queria aplicar, ampliou o espaço cultural e mudou o currículo com a ajuda de pais e professores. E estabeleceu o ensino da língua ucraniana. Sua mais marcante experiência deu-se de 1920 a 1928, na direção da Colônia Gorki, instituição rural que atendia crianças e jovens órfãos que haviam vivido na marginalidade. Lá ele pôs em prática um ensino que privilegiava a vida em comunidade, a participação da criança na organização da escola, o trabalho e a disciplina. Publicou novelas, peças de teatro e livros sobre educação, sendo Poema Pedagógico o mais importante. Morreu de ataque cardíaco durante uma viagem de trem em 1939, ano que ficaria marcado pelo início da Segunda Guerra Mundial.
Para pensar
Makarenko talvez tenha sido o educador que levou às conseqüências mais radicais as questões do espírito de grupo e do trabalho coletivo. Tudo era discutido entre alunos, professores e a direção da Colônia Gorki e da Comuna Dzerzinski. Por essa razão, embora tenha vivido numa época e num contexto totalmente diferentes dos atuais, vale a pena conhecer suas idéias e pensar sobre elas. Mas será que as crianças e os jovens atuais conhecem de fato o significado de grupo? Ou a idéia de coletivo é abstrata? Os jovens se sentem responsáveis pela escola e pelo bem-estar de seus colegas? "Precisamos pensar se estamos formando pessoas cada vez mais individualistas ou coletivas", diz a educadora Cecília da Silveira Luedemann. Estamos realmente educando para a colaboração e a solidariedade?
A obra de Makarenko provoca ainda uma reflexão sobre a disciplina. Estamos sendo permissivos demais? Como atingir o equilíbrio entre limites e liberdade? Makarenko dá algumas respostas. Podemos não concordar totalmente com elas, mas é inegável que seu trabalho produziu resultados positivos num momento de grandes dificuldades sociais. Não estaremos nós em momento equivalente?
Quer saber mais?
Anton Makarenko, Vida e Obra A Pedagogia na Revolução, Cecília da Silveira Luedemann, Ed. Expressão Popular
Poema Pedagógico, 3 vols., Anton Makarenko, Ed. Brasiliense, 1983 (disponível apenas em bibliotecas)
Conferências sobre Educação Infantil, Anton Makarenko, Ed. Moraes, 1981 (disponível apenas em bibliotecas
Fonte: Revista Escola/Abril

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Walter Benjamin


Origem: Wikipédia
Walter Benedix Schönflies Benjamin (1892 —1940) foi um ensaísta, crítico literário, tradutor, filósofo e sociólogo judeu alemão.
Associado à Escola de Frankfurt e à Teoria Crítica, foi fortemente inspirado tanto por autores marxistas, como Georg Lukács e Bertolt Brecht, como pelo místico judaico Gerschom Scholem. Conhecedor profundo da língua e cultura francesas, traduziu para alemão importantes obras como Quadros Parisienses de Charles Baudelaire e Em Busca do Tempo Perdido de Marcel Proust. O seu trabalho, combinando ideias aparentemente antagónicas do idealismo alemão, do materialismo dialético e do misticismo judaico, constitui um contributo original para a teoria estética. Entre as suas obras mais conhecidas, contam-se A Obra de Arte na Era da Sua Reprodutibilidade Técnica (1936), Teses Sobre o Conceito de História (1940) e a monumental e inacabada Paris, Capital do século XIX, enquanto A Tarefa do Tradutor constitui referência incontornável dos estudos literários.
Na adolescência Benjamin, perfilhando ideais socialistas, participou no Movimento da Juventude Livre Alemã, colaborando na revista do movimento. Nesta época nota-se uma nítida influência de Nietzsche em suas leituras. Em 1915, conhece Gerschom Gerhard Scholem de quem se torna muito próximo, quer pelo gosto comum pela arte, quer pela religião judaica que estudavam. Nos últimos anos da década de 1920 o filósofo judeu interessa-se pelo marxismo, e juntamente com o seu companheiro de então, Theodor Adorno, aproxima-se da filosofia de Georg Lukács. Por esta altura e nos anos seguintes publica resenhas e traduções que lhe trariam reconhecimento como crítico literário, entre elas as séries sobre Charles Baudelaire. Refugiou-se na Itália, de 1934 a 1935. Neste momento cresciam as tensões entre Benjamin e o Instituto para Pesquisas Sociais, associado ao que ficou conhecida como Escola de Frankfurt, da qual Benjamin foi mais um inspirador do que um membro.
Benjamin tinha seu ensaio “A Obra de Arte na Época de sua Reprodutibilidade Técnica” na conta de primeira grande teoria materialista da arte. O ponto central desse estudo encontra-se na análise das causas e conseqüências da destruição da “aura” que envolve as obras de arte, enquanto objetos individualizados e únicos. Com o progresso das técnicas de reprodução, sobretudo do cinema, a aura, dissolvendo-se nas várias reproduções do original, destituiria a obra de arte de seu status de raridade. Para Benjamin, a partir do momento em que a obra fica excluída da atmosfera aristocrática e religiosa, que fazem dela uma coisa para poucos e um objeto de culto, a dissolução da aura atinge dimensões sociais. Essas dimensões seriam resultantes da estreita relação existente entre as transformações técnicas da sociedade e as modificações da percepção estética. A perda da aura e as conseqüências sociais resultantes desse fato são particularmente sensíveis no cinema, no qual a reprodução de uma obra de arte carrega consigo a possibilidade de uma radical mudança qualitativa na relação das massas com a arte. Embora o cinema, diz Walter Benjamin, exija o uso de toda a personalidade viva do homem, este priva-se de sua aura. Se, no teatro, a aura de um Macbeth, por exemplo, liga-se indissoluvelmente à aura do ator que o representa, tal como essa aura é sentida pelo público, fico, o mesmo não acontece no cinema, no qual a aura dos intérpretes desaparece com a substituição do público pelo aparelho. Na medida em que o ator se torna acessório da cena, não é raro que os próprios acessórios desempenhem o papel de atores. Benjamin considera ainda que a natureza vista pelos olhos difere da natureza vista pela câmara, e esta, ao substituir o espaço onde o homem age conscientemente por outro onde sua ação é inconsciente, possibilita a experiência do inconsciente visual, do mesmo modo que a prática psicanalítica possibilita a experiência do inconsciente instintivo. Exibindo, assim, a reciprocidade de ação entre a matéria e o homem, o cinema seria de grande valia para um pensamento materialista. Adaptado adequadamente ao proletariado que se prepararia para tomar o poder, o cinema tornar-se-ia, em conseqüência, portador de uma extraordinária esperança histórica. Em suma, a análise de Benjamin mostra que as técnicas de reprodução das obras de arte, provocando a queda da aura, promovem a liquidação do elemento tradicional da herança cultural; mas, por outro lado, esse processo contém um germe positivo, na medida em que possibilita um outro relacionamento das massas com a arte, dotando-as de um instrumento eficaz de renovação das estruturas sociais. Trata-se de uma postura otimista, que foi objeto de reflexão crítica por parte de Adorno.