sexta-feira, 10 de setembro de 2010
HUMANO, DEMASIADO HUMANO
O escritor português José Saramago nasceu em 1922, em Azinhaga, aldeia ao sul de Portugal. Autodidata, publicou seu primeiro romance “Terra do Pecado” aos 25 anos; é considerado um dos responsáveis pelo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa. Em 1998, ele recebeu o prêmio Nobel de Literatura. Também ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa. Saramago vivia em auto-exílio na Espanha, como protesto político contra o Estado português; morreu aos 87 anos, em 18 de junho de 2010.
“Acho que na sociedade atual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de reflexão, que pode não ter um objetivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objetivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem idéias, não vamos a parte nenhuma”. A frase é a síntese do legado de Saramago que dedicou boa parte dos últimos anos de sua vida para denunciar o empobrecimento do mundo, da palavra e da experiência humana.
Saramago levanta questões que se justificam pelas suas reflexões ajustadas à filosofia contemporânea que clama por um novo pensar no mundo absurdo, onde o efêmero e o instante incontrolável parecem estilhaçar o tempo em que os objetos se produzem e se multiplicam em série, destruindo o espaço e ameaçando o homem. As preocupações desse trabalho inserem-se no campo da filosofia, em particular nas reflexões de Nietzsche que envolvem a questão da moral; da moral ocidental: platônica, socrática e castradora.
Seus personagens se insurgem contra a opressão e desordem da vida face à ordem da sociedade. Saramago nos mostra o mundo onde os homens, com seus direitos e vontades, aparecem recolhidos, diminuídos, plasmados, condicionados a uma invisibilidade pública; a uma burocracia total, onde a identidade se dilui – Todos os nomes são todos os homens. É preciso desmoralizar essa moral burocrática e falsa em favor da vida e de uma nova ética. É este o niilismo saramaguiano que deverá constituir-se de uma passagem, pois enquanto homem comprometido com seu tempo, Saramago acredita numa humanidade nova; num novo homem com uma nova vontade de poder generosa e criativa, capaz de inventar a diferença e a identidade humana
Como Nietzsche, Saramago nos fala da necessidade urgente de uma transformação do coração humano. Essa transformação fundamental e necessária recriará uma nova ética devolvendo ao homem a consciência. No entanto, essa transformação só será possível a partir de uma reflexão humana, isto é, de um diálogo freqüente do homem com ele mesmo na sua mais profunda solidão. Solidão como o recolhimento na tarefa da auto-reflexão necessária à transformação.
A escrita de Saramago é intertextual e dialógica; utiliza – se apenas da vírgula e do ponto final, não distinguindo discursos diretos e indiretos. O autor foi o verdadeiro arquétipo do “contador de histórias”, aquele que parece morar em um vilarejo distante, onde exercita com freqüência a metalinguagem e a recuperação da oralidade na narrativa. Com isso aproxima-se do leitor num conto com contornos de realidade com seus textos provocativos, induzindo à reflexão.
É necessária uma viagem dessa ordem para que o homem possa reinventar-se.
SE da Educação
Diretoria Regional de Santos
Maria Lúcia dos Santos Machado
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